Selante resinoso invasivo em fóssulas e fissuras de molares de paciente com risco ao desenvolvimento de lesões de cárie

Autores: Yasmine Mendes Pupo: professora do Curso de Graduação em Odontologia da Universidade Tuiuti do Paraná / doutora em Odontologia na Área de Concentração de Dentística Restauradora e Linha de Pesquisa Materiais Dentários, pela Universidade Estadual de Ponta Grossa – UEPG / Alessandra Vaz P. Hapner: professora do Curso de Graduação em Odontologia da Universidade Tuiuti do Paraná / mestre em Odontologia na Área de Concentração de Odontopediatria, pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC

 

A prevenção da ocorrência de lesões de cárie tem tido um grande avanço ao longo dos anos, principalmente devido ao maior acesso ao flúor pelas populações. Além disso, a maior conscientização da população, com respeito à necessidade de técnicas de higiene bucal e ao emprego de dietas menos cariogênicas, tem contribuído para a redução dos índices de lesões de cárie. Entretanto, lesões de cáries oclusais de primeiros molares permanentes ainda são as mais frequentes.

As crianças e adolescentes mais propensos e com risco elevado à doença cárie devem ter as fóssulas e fissuras de seus dentes seladas, como uma das formas de prevenção. Os selantes dentários agem como uma barreira mecânica contra a colonização de novos microorganismos nesses locais, além de prevenir a penetração de carboidratos fermentáveis, de modo que o remanescente bacteriano não seja capaz de produzir ácidos em concentrações cariogênicas.

As bactérias são capazes de se reproduzir em superfícies profundas e estreitas, porém em muitos casos, as cerdas das escovas dentais não chegam às profundezas destes espaços para remover tais bactérias. Assim, quanto maior a inclinação dos planos das cúspides como fóssulas e fissuras, maior a chance de se desenvolverem lesões de cáries; enfim, uma lesão de cárie poderia ser evitada por meio do controle do biofilme, sobre a sua superfície. Neste contexto, materiais de vedação são ideais para preencher as depressões anatômicas dos dentes, criando uma obstrução física, que impedirá a passagem de bactérias, resíduos de alimentos e nutrientes para estes espaços microscópicos.

Selantes resinosos foram desenvolvidos para serem aplicados nas superfícies oclusais susceptíveis ao desenvolvimento de lesões de cárie, que se originam em fóssulas e fissuras, criando uma camada que evita a retenção de restos de alimentos e de biofilme, impedindo, assim, o desenvolvimento das lesões de cárie. A vedação desses espaços é uma das formas eficientes de deter o processo de cárie em pacientes de risco. Estes materiais podem ser utilizados de maneira eficaz desde que a técnica seja bem executada e a preservação seja realizada, essencial para o sucesso clínico a longo prazo. Desta forma, teve-se como objetivo apresentar um caso clínico com indicação da aplicação de selante resinoso invasivo em fóssulas e fissuras de molares permanentes, em paciente de risco ao desenvolvimento de lesões de cárie.

Relato do caso

Paciente com 7 anos de idade, gênero feminino, leucoderma, apresentou-se à Clínica Infantil da Universidade Tuiuti do Paraná, com indicação para aplicação de selantes resinosos nos primeiros molares permanentes, devido à presença de fóssulas e fissuras profundas nestes dentes, além da dificuldade de higienização nessas regiões.

Após anamnese e exame clínico detalhado, esclareceu-se ao paciente e seus responsáveis a importância da higiene bucal, e de como se deveria proceder para a realização de uma adequada escovação. Ao exame clínico e radiográfico, com radiografias interproximais, constatou-se a presença de lesões incipientes e ativas de cárie na superfície de esmalte dos molares (Fig. 1). Assim, apresenta-se neste caso a técnica invasiva de selantes de fóssulas e fissuras no dente 46 (Fig. 2), o qual apresentava cavitação em superfície de esmalte. Para tanto, checou-se os contatos oclusais, observando-se que não havia zonas de interferência oclusal nas regiões de fóssulas e fissuras, e que o dente se apresentava em estágio final de irrupção e desoclusão. Realizou-se profilaxia prévia com pedrapomes e água, lavagem e secagem das superfícies oclusais, deixando em condições adequadas para realização do selamento das fóssulas e fissuras. Realizou‑se o isolamento absoluto (Fig. 3) após uso de anestésico tópico, e para um melhor vedamento do isolamento utilizou-se a barreira gengival Top Dam (FGM). Utilizou-se a ponta diamantada #1011 (KG Sorensen) para remoção do tecido cariado em superfície de esmalte (Fig. 4). Complementou-se a profilaxia realizada para limpeza da superfície, com auxílio de escova de nylon de pequeno diâmetro Dhpro CR05 (Dhpro) (Fig. 5). Aplicou-se o condicionador de ácido fosfórico a 37% (Condac 37, FGM) por 30s, lavou-se abundantemente e secou-se a superfície (Figs. 6 e 7).

A seguir, foi realizada a técnica modificada para aplicação de selante resinoso fotopolimerizável Prevent (FGM), com carga e matizado, através da aplicação prévia do sistema adesivo Ambar (FGM), em 2 camadas com auxílio de dispositivo sônico vibratório. A fotopolimerização final foi de 10 segundos, para melhorar a penetração mecânica na estrutura dental (Fig. 8). Adaptou-se a ponteira de aplicação na seringa do selante Prevent e aplicou-se a resina por toda a área de fóssulas e fissuras (oclusal, vestibular ou palatina) (Figs. 9 e 10). Utilizou-se uma espátula para aplicação de corantes e/ou pigmentos em fissuras (LM-Arte Fissura by Style Italiano, LM-Instruments Oy) (Figs. 11 e 12), com uma ponta extremamente delicada, para espalhar o selante e removê-lo das regiões de interferência oclusal. Realizou-se a fotopolimerização durante 20s por face, conforme as recomendações do fabricante (Fig. 13). Checou-se com sonda exploradora, a lisura do material e a ausência de bolhas, degraus ou falhas no selante e procedeu-se a aplicação tópica de flúor neutro, antes da remoção do isolamento absoluto (Figs. 14 e 15).

Radiografia interproximal inicial para diagnóstico de cárie
Radiografia interproximal inicial para diagnóstico de cárie

 

Aspecto inicial, após profilaxia prévia do dente 46
Aspecto inicial, após profilaxia prévia do dente 46

 

Isolamento absoluto do dente 46, utilizando o grampo 14 e vedamento com auxílio de barreira gengival
Isolamento absoluto do dente 46, utilizando o grampo 14 e vedamento com auxílio de barreira gengival

 

Remoção do tecido cariado em superfície de esmalte com ponta diamantada
Remoção do tecido cariado em superfície de esmalte com ponta diamantada

 

Profilaxia realizada para limpeza da superfície, com auxílio de escova de nylon de pequeno diâmetro (Dhpro)
Profilaxia realizada para limpeza da superfície, com auxílio de escova de nylon de pequeno diâmetro (Dhpro)

 

Condicionamento do esmalte com ácido fosfórico 37% por 30 segundos, lavagem abundante pelo mesmo tempo e secagem
Condicionamento do esmalte com ácido fosfórico 37% por 30 segundos, lavagem abundante pelo mesmo tempo e secagem

 

07 - Selante resinoso invasivo em fóssulas e fissuras de molares de paciente com risco ao desenvolvimento de lesões de cárie

Aplicação do sistema adesivo Ambar (FGM) e fotopolimerização por 10 segundos
Aplicação do sistema adesivo Ambar (FGM) e fotopolimerização por 10 segundos

 

Aplicação do selante resinoso Prevent (FGM) na região de fóssulas e fissuras com ponta aplicadora do próprio material
Aplicação do selante resinoso Prevent (FGM) na região de fóssulas e fissuras com ponta aplicadora do próprio material

 

10 - Selante resinoso invasivo em fóssulas e fissuras de molares de paciente com risco ao desenvolvimento de lesões de cárie

Espátula para aplicação de corantes e/ou pigmentos em fissuras. O selante foi aplicado suavemente com a espátula, removendo o excesso de material das regiões de posterior interferência oclusal
Espátula para aplicação de corantes e/ou pigmentos em fissuras. O selante foi aplicado suavemente com a espátula, removendo o excesso de material das regiões de posterior interferência oclusal

 

12 - Selante resinoso invasivo em fóssulas e fissuras de molares de paciente com risco ao desenvolvimento de lesões de cárie

Fotoativação por 20 segundos do selante resinoso
Fotoativação por 20 segundos do selante resinoso

 

Após inspeção clínica, avaliou-se a lisura do material e a ausência de bolhas, degraus ou falhas no selante e procedeu-se a aplicação tópica de flúor neutro, antes da remoção do isolamento absoluto
Após inspeção clínica, avaliou-se a lisura do material e a ausência de bolhas, degraus ou falhas no selante e procedeu-se a aplicação tópica de flúor neutro, antes da remoção do isolamento absoluto

 

Aspecto final após a remoção do isolamento absoluto
Aspecto final após a remoção do isolamento absoluto

 

Final
Final

 

Discussão

A odontologia preventiva ressalta constantemente a necessidade da realização de um correto diagnóstico das lesões de cárie, com adequada acuidade visual, em um campo limpo, seco e iluminado, com instrumentos apropriados e/ou modificados se necessário e sem exercer pressão excessiva, além do discernimento do risco de doença cárie de cada paciente. No entanto, mesmo com o progresso de promoção de saúde bucal e prevenção da doença cárie, ainda a face oclusal dos dentes posteriores é a mais acometida. Selantes em fóssulas e fissuras são uma maneira coadjuvante, segura e eficaz para prevenir as lesões de cárie dentária e devem ser considerados como parte de uma estratégia global de estratégias preventivas, que incluem a orientação de uma alimentação saudável e o uso de dentifrícios contendo fluoreto com no mínimo 1.000 ppm de flúor.

O correto diagnóstico é fundamental para a correta indicação de selantes. O procedimento do isolamento absoluto, como apresentado no caso clínico, favorece a longevidade deste procedimento clínico adesivo. Os selantes podem ser resinosos ou ionoméricos, sendo os selantes resinosos o material de escolha, neste caso. Porém, o cimento de ionômero de vidro pode ser utilizado como um selante provisório preventivo, quando o controle de umidade não pode ser garantido, por exemplo, em um dente que recentemente entrou em erupção. O presente relato de caso clínico foi realizado com a utilização do selante da FGM, com carga, fotopolimerizável e matizado. O selante resinoso é um material à base de BISGMA, auto ou fotopolimerizável, com ou sem carga, incolor ou matizado e ainda, com ou sem flúor incorporado na sua composição química.9 Quanto à técnica de sua utilização, esta deve ser criteriosa e seguir as recomendações do fabricante, garantindo a retenção, efetividade e longevidade do material.

Os passos durante a execução da técnica devem ser realizados de maneira criteriosa. O condicionamento ácido produz microporosidades na superfície do esmalte, permitindo que o selante resinoso penetre nesta superfície e produza uma união mecânica dos prolongamentos resinosos quando polimerizados. Esta etapa deve ser executada de forma a favorecer esta interação, com um tempo de condicionamento de aproximadamente 30 segundos e correto enxágue pelo dobro do tempo, observando-se após a secagem, uma característica de superfície esbranquiçada.4 O selante é aplicado à superfície dental preparada em pequenas quantidades e espalhado suavemente, da porção mesial, em direção à porção distal, com auxílio de um instrumento de ponta fina como a sonda exploratória. No presente caso, utilizou-se um instrumento de aplicação de corantes e pigmentos, extremamente delicado, favorecendo a inserção do material resinoso com uma fina película, a qual cumpre sua finalidade de proteção da região de sulcos. Excessos de material que possam ter escoado sobre a crista marginal ou em direção à região cervical, devem ser removidos antes de retirar o isolamento, com auxílio de pontas de borrachas abrasivas ou pontas diamantadas de granulação fina ou extrafina.

Para finalizar, o mais importante é a indicação correta do uso de selantes: pacientes infantis com risco ou atividade da doença cárie, dentes presentes na boca há menos de 3 anos e livres de lesões de cárie, fissuras profundas e não coalescentes, dentes irrompidos há menos de 2 anos ou sem oclusão funcional estabelecida, com maior acúmulo de biofilme dental, e ainda, crianças com pouca habilidade psicomotora na escovação e, consequentemente, com maior risco de desenvolvimento de lesões de cárie. A proservação é fundamental para o sucesso clínico, pois os selamentos podem sofrer falhas ou serem perdidos com o tempo, necessitando que se estabeleça um acompanhamento de 6 em 6 meses do paciente, tanto para reforço dos hábitos preventivos, de escovação e de dieta, como da avaliação da retenção dos mesmos.

Conclusão

Concluiu-se que o profissional deve fazer um correto diagnóstico clínico do paciente, reconhecendo a atividade e o risco para o desenvolvimento da doença cárie, e estabelecer terapias inseridas no contexto educativo-preventivo, que auxiliem de forma efetiva o controle químico-mecânico do biofilme dental. O selamento de fóssulas e fissuras constitui-se em uma medida coadjuvante eficaz no controle e prevenção da doença cárie. Observou-se que o selante Prevent (FGM) é um material que possui excelente molhabilidade, o que gera adequada capacidade de vedação das fóssulas e fissuras.

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