Especialista em periodontia esclarece dúvidas sobre os riscos da presença de etanol em alguns antissépticos bucais.
Os enxaguantes bucais, também conhecidos como antissépticos bucais, têm conquistado cada vez mais os consumidores com promessas de hálito fresco e proteção contra as cáries. Mas, apesar disso, alguns especialistas em odontologia mostram certa resistência com o produto e, muitas vezes, não o indicam a seus pacientes como item complementar para a higiene oral.
Para o Dr. Claudio Mendes Pannuti, professor e doutor de Periodontia da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (Fousp), a explicação para tal resistência está na ideia de que os enxaguantes bucais, especialmente os que contêm etanol em sua formulação em concentrações que variam de 5% a 27%, são possíveis causadores de câncer bucal. “Essa associação tem gerado controvérsias há décadas entre os cirurgiões- -dentistas, mas um estudo recente, feito por um pesquisador (referência do estudo: Gandini et al., 2012) comprova que ela não existe”, diz.
Dr. Pannuti explica que, antes de mais nada, os profissionais de odontologia precisam fazer uma distinção entre ingestão de bebidas alcoólicas (esta sim, uma das causadoras de diversos tipos de câncer, incluindo bucal e da orofaringe) e uso tópico de enxaguantes que possuem álcool em suas formulações. Isso porque bebidas alcóolicas contêm, além de etanol, diversos contaminantes, como nitrosaminas e aflatoxinas, que são consideradas carcinogênicas. “O consumo de bebidas alcoólicas gera acetaldéido, formado pela oxidação do etanol e também considerado um carcionógeno humano”, acrescenta.
Já o álcool utilizado em enxaguantes é de grau farmacêutico, livre de impurezas. “Talvez o fato do uso de enxaguantes com álcool elevar um pouco as concentrações de acetaldeído na saliva tenha transitoriamente sido o motivo de suspeita de serem causadores de câncer bucal”, opina o Dr. Pannuti, que logo esclarece: “Mas essa concentração retorna rapidamente aos valores iniciais, enquanto que após a ingestão de bebidas alcoólicas, o acetaldeído pode ser detectado na boca após horas”.
Revisão sistemática – Para chegar à conclusão de que o câncer bucal e da orofaringe não tem relação com os enxaguantes bucais, os pesquisadores fizeram uma revisão sistemática que investigou o efeito de enxaguantes sobre o aumento de risco de câncer bucal, por meio de estudos epidemiológicos.
Os autores não encontraram associação significativa entre uso de enxaguantes com álcool e câncer bucal, nem tendência de aumento de risco conforme a quantidade de uso diário destes produtos. E, por isso, a pesquisa concluiu que, quando usado conforme indicado (duas vezes ao dia por 30 segundos), o breve contato do etanol dos enxaguantes com a mucosa não promove efeito carcinogênico, e por isso pode ser considerado seguro.
“No entanto, esta mesma pesquisa sugere uma associação entre o câncer bucal e a falta de cuidados com a saúde oral”, frisa o Dr. Pannuti. E a falta de cuidados englobam baixa frequência de escovação e hábitos como fumar ou consumir bebidas alcoólicas em excesso. “Em suma, a recomendação que a pesquisa oferece é a de se manter sempre uma rotina diária de higiene bucal” conclui.
Qual enxaguante indicar?
O uso coadjuvante de antissépticos bucais promove benefícios adicionais na redução de placa bacteriana e gengivite, quando comparado com controle mecânico do biofilme. Por isso, segundo o Dr. Pannuti, indicá-lo como um complemento à higiene bucal dos pacientes é muito válido. “A dica do anticéptico bucal correta vai depender da situação clínica do paciente”, diz ele. Para usos pós-operatórios e de curto prazo, uma boa opção são os enxaguantes com a clorexidina, pois apresentam forte evidência de eficácia. Já para usos mais prologados, a indicação seria optar por aqueles que possuem princípios ativos eficazes, porém menos agressivos, como no caso de bochechos com óleos essenciais.
Fonte: Jornal da ABO 2015 (Edição 154 | Agosto/Setembro/Outubro 2015)